segunda-feira, 15 de março de 2010

Madame Ilusão

Thiaguinho é um menino bom. Querido por amigos e familiares. Porém, é um menino implicante e reclamão. Reclama de tudo, até mesmo quando não tem razão. E implica com todos, até que percam a paciência com ele. A mãe sempre disse que ele é uma pessoa de desafios. Sim, ele desafia todo mundo, mas não quer brigar, quer apenas ver as pessoas saírem do sério por alguns minutos. Mas tem bom coração. Tem cara de sério. Começaram a chamá-lo de  Thiaguinho por ser o mais novo de todos da turma, mas o mais alto. Talvez fosse precoce, ele pesava às vezes. Sem encontrar solução para uma coisa que o inquietava, descobriu o reggae, e se descobriu. Mas como os amigos não curtiam a mesma coisa, ele escondeu. Ele gosta de ouvir reggae sozinho em seu quarto. É o único lugar onde se encontra realmente, com o som que lhe completa. Ele fecha os olhos e mergulha, se solta, sente os pés descalços pisando na areia da praia, sente o cheiro da fumaça das pessoas que estão fumando ao seu redor. Sente a música correr em suas veias como sangue. Se sente... A mãe diz que é música de drogado, que quem ouve esse tipo de som são aqueles caras que vivem nas ruas, largados, hippies sem emprego fixo e bebâdos. Thiaguinho não bebe, mas tem em seu quarto uma garrafa de tequila guardada, para quando precisar. Ele é muito precavido. Ele dança embalado por Planta e Raiz e imagina como ficaria se bebesse sozinho toda a tequila que fica olhando pra ele enquanto ele desliza pelo quarto como se estivesse flutuando ritmado por seu reggae companheiro... Mas a bebida é apenas para quando for necessário se embriagar. "Paz é a sensação que vem da mente ao coração, descontamina o ambiente, e vai emanando de gente pra gente..." E então ele pensa: quando? Quando saberei que estou precisando beber? Quando terei coragem de me embebedar até cair? Nunca. Mas o líquido mágico o chama, o domina, a música toca insistente, e ele desiste. Talvez agora seja uma boa hora, ou não, mas ele só vai saber se tentar. Então flutua até onde está a companheira de tantas ilusões desfeitas e decide soltá-la daquela prisão. Se ela foi feita para ser bebida e ficar naquela garrafa para sempre não terá seu destino completo. Leva a garra à boca, sem complexo e sem culpa. Remédio para todos os males. O primeiro gole queima Thiaguinho por dentro, queima sua virtude de menino bom e o transforma num espectro dançante naquele quarto que gira... gira... gira... Noites vazias voltam à sua memória, mas ele não lembra por que. Mais um gole. Vontade de dançar! E mais, e mais, e mais, ele pede que aquilo fique apenas entre eles, a Madame Tequila promete que sim. Ela agora é uma deusa, uma musa, uma cantora de reggae linda e sóbria ao lado dele, sorrindo pra ele, enquanto ele sente que o chão está ficando mais distante... Thiaguinho ouve as asas das borboletas que passam bem perto de seus ouvidos, e sente na ponta de seus dedos as pequenas mãos das ninfas douradas que o conduzem para um paraíso cintilante. Ele pede pra mãe não apagar a luz, mas tudo fica mais escuro a cada segundo, e ele sente que o corpo quer se lançar num abismo sem fim. Mas ele não pode. O reggae está no fim. Thiaguinho desaba, bate a cabeça no assoalho. Só se lembra da mãe chamando seu nome por trás da porta do quarto. Ah Tequila! Jamais me enganará assim outra vez.

Um comentário:

  1. Vamos lá.
    Ótima Historia, fez com que meus olhos não se perdesse e meu cérebro não pensasse em outra coisa a não ser como será o final dessa historia.
    Como disse Ótima Historia e em minha opinião nota 9.
    Muito bem.
    Até Logo.
    Beijos.

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